segunda-feira, 28 de maio de 2012

A PELE QUE HABITO - SÉRIE FILMES E PSICANÁLISE

Resenha - Almodóvar volta em grande forma com "A Pele que Habito"




DivulgaçãoLedgard e Vera Cruz, criador e criatura

“A Pele que Habito” acabou escapando por entre os dedos do zeitgeist simplesmente por ter sido lançado em 2011, ano em que toda a crítica cinematográfica mundo afora resolveu gastar tempo e repertório contrapondo “Melancolia” a “Árvore da Vida”. Mas a verdade é que Pedro Almodóvar, o diretor, se não os prêmios, merecia um bocado mais de atenção por este seu mais novo filme.

É complicado falar sobre a trama sem entregar algumas surpresas, mas aqui vai uma tentativa: acompanhamos um médico chamado Robert Ledgard, papel de Antonio Banderas, que está tentando ‘melhorar’ a pele de Vera Cruz, papel da belíssima Elena Ayala. Mas por trás do esforço, há, como sempre em Almodóvar, quilos e quilos de traumas, que o roteiro vai aos poucos descascando.

DivulgaçãoO macacão molda o corpo, mas não a alma


O diretor espanhol resolveu se tornar autorreferente. Repete, com maior êxito, a mesma estrutura de “Abraços Partidos”, mostrando o desenrolar dos fatos antes de mostrar os fatos em um longo flashback. Além de uma cena que parece extraída diretamente de “Kika”, filme já está chegando aos seus 20 anos. O mote aqui parece ser mesmo o de abraçar parte da crueza de seus primeiros trabalhos, como “Ata-me” ou “Carne Trêmula”, ao mesmo tempo em que encontra certas sutilezas narrativas claramente marcantes em sua fase, digamos, pós “Fale Com Ela”.

A chave para decifrar parte dessas sutilezas (ou signos, como queira) está em uma frase que aparece em determinado momento do filme: “não confundir a forma com a essência” (ainda que a legenda mutile parte do significado). A frase se refere à prática de yoga, mas se aplica a tudo o que o filme, no fundo, se propõe. Na verdade, a praticamente tudo o que Almodóvar se dedica a trabalhar em seus filmes, mais notadamente em relação à sexualidade. Afinal, como é o próprio Almodóvar uma alma feminina em recipiente masculino, e não é o recipiente o que define seu próprio interior.

DivulgaçãoLedgard trabalha em sua obra


A câmera acompanha copos e vasilhas sendo preenchidos, roupas sendo usadas, ou mesmo o macacão modelador que protege a pele de Vera. Tudo é invólocro, recipiente, que busca moldar e conformar a essência. Mas, como o nome do filme indica, nós apenas habitamos as nossas peles, ela não nos define por princípio. Cada personagem tem seus vincos, rugas e cicatrizes mostrados e exaltados. Exceto os de Vera, que possui a pele mais perfeita já mostrada em um filme. É necessário que seja assim, para que as pesquisas do Dr. Ledgard, verdadeiro Victor Von Frankenstein moderno, justifiquem sua eficácia.

E são justmente nas imagens de pele e corpos, grande mote da narrativa, que Almodóvar se mostra como o grande esteta que é. Ele parte de Mary Shelley e de seu “Frankenstein”, o monstro da pele costurada, mas chega em um lugar muito mais particular, mais próximo de suas narrativas mais interessantes como “A Má Educação” e “Tudo Sobre Minha Mãe”, ainda que, aqui, abrace o horror e a ficção científica como veio narrativo.

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