segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Seminário em Vitória discute violência e idade penal à luz da psicanálise


Participantes do encontro ressaltaram que a falta de estrutura familiar acaba por aumentar os índices de delinquênciaSLívia Francez
23/08/2013 

O Pleno do Tribunal de Justiça do Estado (TJES) sediou nesta sexta-feira (23) o seminário Violência e Idade Penal, promovido pela Escola Lacaniana de Psicanálise de Vitória em parceria com o Centro de Apoio Operacional da Infância e da Juventude do Ministério Público Estadual (MPES) e o TJES. O evento tem o intuito de discutir a redução da maioridade penal, com a participação de psicanalistas, operadores de direito e de segurança pública. 
 
A abertura do seminário foi feita pelo psicanalista José Nazar, que participou de debate com a coordenadora das Varas de Infância e Juventude do Estado, juíza Janete Pantaleão e com o delegado adjunto da Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA) de Vitória, Érico Mangaravite. 
 
Os três palestrantes foram unânimes em afirmar que a falta de estrutura familiar é um dos principais fatores para que levam à delinquência. 
 
Nazar, que é médico psiquiatra e membro da Escola Lacaniana de Psicanálise de Vitória, ressaltou que a falta de função paterna é o que mais leva à delinquência. Na psicanálise, a função paterna não é necessariamente exercida por um pai, mas serve para “cortar” a relação entre mãe e filho e estabelecer limites na criança, ou seja, é quem vai fazer o indivíduo entender o discurso público e as leis. “Os sujeitos que não tiveram o impacto da palavra estão mais propensos a delinquir”, disse ele. 
 
A juíza Janete Pantaleão salientou a importância da função paterna, que tem o objetivo de informar a lei, de passar para a prole quais são as consequências da lei e também de proteger. Ela lembrou de um caso ocorrido em Conceição da Barra (norte do Estado) no início deste ano, em que uma menina de 11 anos esfaqueou outra de 13 após uma discussão. “Talvez faltasse na vida dela alguém que a defendesse e, por isso, ela criou forças suficientes para atacar aquela que seria sua algoz”, lembrou. 
 
Ela ressaltou que o declínio da função paterna é fundamental para o aumento da violência juvenil. A juíza também lembrou que a cultura da violência nega a muitos indivíduos essa proteção e esses direitos fundamentais. 
 
Janete disse que não se pode ter uma visão romanceada de adolescentes que cometem atos infracionais, mas responsabilizar a pessoa que comete estes atos e dar a possibilidade dela se reerguer e internalizar a figura do “pai”, que pode um juiz, professor ou até um vizinho, que vai impedir aquelas agressões prossigam. “Nesse momento de medo e sofrimento que vivemos, precisamos rastrear e identificar quais as motivações. Modificação de leis, aumento de medidas socioeducativas, redução da idade penal são balela que fica bonita em discurso político eleitoreiro, mas não na nossa realidade”, contou. 
 
O delegado Érico Mangaravite iniciou a fala com uma frase do jurista alemão Franz von Liszt que disse que “a melhor política criminal é uma boa política social”. Ele ressaltou que a frase, dita há mais de 130 anos, ainda é aplicável nos dias de hoje, quando se discute o assunto. 
 
Ele usou a experiência na DPCA para mostrar que a falta da figura paterna, ou de alguém que exerça essa função, acaba por onerar ainda mais a mãe, que assume diversas funções no seio familiar, faltando outra figura que a apoie neste momento. 
 
O delegado contou que nos plantões dos Departamentos de Polícia Judiciária (DPJs) fica mais perceptível a falta de estrutura familiar que acaba levando à delinquência. “Quantas não são as situações em que um adolescente o adolescente apresentado não será apreendido, já que não há flagrante que leve a essa medida, e tentamos entrar em contato com o pai e não há chance, e não se encontra a mãe e o Conselho Tutelar que tem de exercer a função familiar”, disse ele. 
 
Ele acrescentou que a discussão em torno do assunto girando em torno apenas da redução a idade penal é um caminho perigoso. “O Brasil historicamente tem a questão da política do isolamento, vide a questão manicomial, os sanatórios para tuberculosos, a exclusão de pacientes com hanseníase da sociedade, as crianças em orfanato. O País gosta de tratar os problemas dessa maneira”, disse ele, completando que quando se discute só a redução da maioridade penal, sem se preocupar com as outras questões sociais, a sociedade tende a caminhar para o lado da política de isolamento.
 

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